DIRETAS? INDIRETAS? E o que mais interessa, não será enfrentado?

Reflexões Atuais

DIRETAS? INDIRETAS? E o que mais interessa, não será enfrentado?

 

Diretas já ou Eleições Indiretas? Redução da maioridade penal ou manutenção da atual? Legalização e descriminalização das drogas ou permanência da criminalização vigente?  Indagações nascidas em seios sociais espalhados pelo país e difundidas por veículos de comunicação - entre eles, a própria internet e suas redes e teias -, findam por ganhar, muitas vezes, atenção até desproporcional, tendo em vista e considerando, estritamente, seu resultado final, que, nos exemplos dados, diretamente não se afiguraram concretizados, embora, sob foco diverso, no que diz respeito à pluralização e à difusão do diálogo e de discussões, tenham conseguido repercussão. De qualquer forma, entre outras perguntas que levam a uma série de discussões teórico-metodológicas, assim como a entendimentos proferidos por diversos grupos sociais, ligados a variados ramos do saber, a primeira delas tem ocupado espaço privilegiado em vários canais de comunicação. Entretanto, nada obstante quem aqui escreve possa até ter uma opinião preliminar sobre o momento político brasileiro, suas consequências e desdobramentos jurídicos, é importante, em muitos casos, que se desvie o foco de cernes discursivos para que se possa melhor visualizar problemas estruturais e, não conjunturais. É certo que, no tocante ao atual quadro político nacional, em caso de vacância do cargo de Presidente da República, os olhares se voltam para o Art. 81 da Constituição de 1988, que estabelece que, “vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga”, com a especificidade contida em seu § 1º, o qual assim estatui: “§ 1º Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei”. Assim, apesar de vários estudiosos e personalidades brasileiros entenderem que eleições diretas para a presidência seriam a solução mais adequada, com fundamentação buscada, entre outros, nos relevantes Artigos 1º, parágrafo único, e 14, todos da Constituição da República[1], aqui se profere – sempre prestigiando a máxima valorização das normas jurídicas existentes, seja no âmbito constitucional, seja no da farta legislação hierarquicamente inferior à Carta Magna nacional, mas, nem por isso, desprovida de qualquer importância - posição inicial de respeito direto ao Artigo mais especificamente voltado para a solução da problemática, qual seja, o acima já salientado Art. 81, que estabelece que eleições indiretas ocorrem em caso de vacância do cargo de Presidente da República, caso esta última ocorra nos dois últimos anos do mandato presidencial de quatro anos. Posição esta coerente com a trajetória do ora Autor de sustentar o respeito à Constituição e ao devido processo legal[2]. A necessidade de lei complementadora poderia ser suprível mediante rápida atuação do Congresso Nacional ou por uma interpretação direta, objetiva e conferidora de força normativa à Constituição, consagrando-se o mandamento já exposto e deixando para regulamentação infraconstitucional emergencial – por meio de resoluções, decretos etc. -, a forma pela qual se dariam as referidas eleições. Paralelamente, a recepção de lei já existente, tal como o Código Eleitoral, com a alteração recente e decorrente da Lei nº 13.165/2015[3], como complementadora do referido Artigo poderia também ser a solução para o impasse criado, desde que não se estivesse diante de flagrante inconstitucionalidade[4]. Assim como, da mesma forma, uma veloz alteração do texto constitucional, por meio da aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (a PEC 227/2016 encontra-se em tramitação no Congresso Nacional, versando sobre o tema ora aqui tratado), poderia representar a saída para a própria indagação desde o início deste texto salientada, repita-se, se o momento político brasileiro atual poderia findar em eleições diretas[5] ou indiretas para a Presidência da República. Entretanto, em que pese o levantamento acima, aqui se pretende ampliar o foco e se chamar a atenção para problemas de maior amplitude, ao nível macro e, não, restrita, específica e estritamente analisados. Pois bem, nessa linha, antes mesmo de qualquer preocupação sobre possíveis e eventuais eleições presidenciais diretas ou indiretas, pergunta-se: qual a grande mudança, tanto no cenário político e eleitoral brasileiro, quanto no jurídico, relativamente aos categorizados “direitos políticos”, parte dos quais constitucionalizados em 1988?!? Para além da já anteriormente citada Lei de 2015, de apertada magnitude reformista, nada, ou seja, nenhuma outra medida legislativa de porte foi tomada para que se pudessem vislumbrar horizontes distintos. Assim, sem que se depare o país com uma rediscussão do funcionamento de sua política, ainda que no sentido mais genérico do vocábulo, dificilmente ter-se-á qualquer mudança significativa nos rumos jurídicos, políticos e, por consequência, também econômicos e sociais do país, de acordo com o tão almejado pela população em geral, subdividida em seus mais variados grupos sociais. Caso não sobrevenha uma reforma real e verdadeira nas bases da mencionada política brasileira, a convocação, ocorrência e o resultado de eleições diretas ou indiretas podem até ser menos ou mais legítimos, menos ou mais legais, enfim, menos ou mais constitucionais, a depender de interpretações e entendimentos variados, mas não redundarão em verdadeiras soluções ou, pelo menos, tentativas e/ou esboços concretos, objetivos e, conforme aqui considerado, reais de aprimoramentos evolutivos para os tantos problemas vivenciados por um Brasil contemporâneo imerso em crise, talvez, sem precedentes em sua história. Caixas 1, 2, 3 e os reais métodos de financiamento privado ou público de campanha; sistema eleitoral, incluindo o complexo meio pelo qual membros do Poder Legislativo elegem-se, ocupam e desocupam seus cargos; informação e debate junto à população e a partir dela, de maneira massiva, constante, educativa e proveniente de variadas instituições, a fim de pluralizar interesses; criação de metas, ainda que de materialização a longo prazo, com o fito de diminuição gradativa do voto vinculado ao populismo condenável e à sua esfera mais cruel; enfim, entre tantas, profundas e necessárias reflexões e questões, o engajamento do país na defesa da Constituição e de seus pilares democráticos, considerando, sobretudo, ter o Brasil, na esteira de uma série de nações desenvolvidas, subdesenvolvidas e em desenvolvimento, escolhido o modelo constitucional para seu Estado, a partir do qual é a Constituição a líder normativa do país e, por conseguinte, também norteadora do futuro brasileiro em amplo espectro. Em resumo, portanto e, em analogia da qual ora se faz uso, ou se enfrenta o leão como ele realmente é ou, por outro lado, apenas serão atacadas as carcaças de suas presas já, muito provavelmente, por ele e pela natureza consumidas. B, L.



[1] Em defesa de “Diretas Já”, a partir de fundamentos contidos na própria Constituição e ordem constitucional vigentes, conferir: <http://justificando.cartacapital.com.br/2017/05/29/defesa-constitucional-das-diretasja/>.

[2] Em área “Reflexões Atuais”, deste próprio site, uma série de textos nos quais sempre a meta maior é a defesa do Estado constitucional, de seu modelo e, por corolário, da Constituição da República de 1988. Conferir: <http://www.bonizzato.com.br/categorias.php?id=1>.

[3] Assim estatuem os os §§ 3º e 4º, do Art. 224, da Lei 4.737, de 15 de julho de 1965: § 3o A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados. § 4o  A eleição a que se refere o § 3o correrá a expensas da Justiça Eleitoral e será: I - indireta, se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato; II - direta, nos demais casos”.

[4] Foi proposta Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 5525, ajuizada pela Procuradoria Geral da República) em face da atual redação do Art. 224 do Código Eleitoral, encontrando-se, a citada Ação, em tramitação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).

[5] Em também defesa das “Diretas Já”, mas a partir de fundamentos a serem inseridos no texto constitucional pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 227/2016, conferir: < https://jota.info/artigos/vacancia-presidencial-em-tempos-de-ruptura-institucional-27052017>. No referido Artigo, conclusivamente: “Certo estamos que a aprovação da PEC 227/2016 do Deputado Miro Teixeira é a forma constitucionalmente adequada para a resolução do dilema constitucional da vacância do cargo de Presidente da República”.