REFORMAS E MAIS REFORMAS: a "Era Cunha", seus desdobramentos no Governo 2016/2017/2018 e direitos fundamentais

Reflexões Atuais

A ex-Presidente da República, eleita em 2014 e impedida de continuar na Presidência em 2016, durante seu curto segundo mandato, conviveu com complexas relações institucionais, sobretudo no que tange aos diálogos com os Poderes Legislativo e Judiciário. E, no que diz respeito àquele, principalmente a dinâmica dos interesses políticos entre o Executivo e a Câmara dos Deputados, representada, de forma maior, na figura de seu então presidente, na época Deputado Eduardo Cunha, mostrou um grande desgaste. E, tal fato, somado a estratégias de oposição ao Governo e a uma política governamental que se alongava no país por mais de 13 anos, com perspectivas de permanência por mais 02, 06 ou 10 anos, previsão que poderia se consolidar para menos ou, até mesmo, para mais tempo, conduziu a um processo de disputa como poucas ou nenhuma vez se presenciou na história recente das relações institucionais e políticas do Brasil. Propostas de Emendas à Constituição (PEC’s) e Projetos de leis aprovados a "toque de caixa", em plenos horários noturnos e sem o mínimo debate social, dada a relevância de várias matérias discutidas e votadas, marcaram uma época na história brasileira. E, se tais cenários, nos resumidos dizeres acima, tiveram grande participação na desestruturação de um Governo e estruturação de forças contrárias àquele, deixaram uma herança para um futuro próximo que, atualmente, o Brasil já vivencia. Por corolário, para além da continuação das votações noite adentro, com pautas quase sem discussão, o governo sucessório ao que fora alvo de impeachment inseriu como metas para o Brasil reformas de relevo, a maioria das quais realmente modificativas, em sentido amplo, não somente da Constituição, mas também das políticas governamentais de outrora, com francos reflexos no modus vivendi da população brasileira. Assim, a PEC dos "gastos" ou do "teto", acrescida da Reforma Trabalhista e da Reforma da Previdência - esta última ainda não concretizada até o término de elaboração deste texto -, são claríssimos exemplos de como o atuar Legislativo, em alguns aspectos, não atentou para mudanças amplas de comportamento social da última década, ligadas a uma desconfiança crescente na democracia representativa vigente e à consequente maior vontade de participação, sempre mais direta, nos negócios políticos do Estado, pela população. E isto porque, principalmente, apesar de uma inversão de polos ter-se aparentemente operado e de partirem do Poder Executivo, que voltou e passou a ser o protagonista no jogo político brasileiro, ainda mais no que concerne às macro relações entre os Poderes, as referidas Reformas já aprovadas, não obstante sua magnitude política, social e econômica, não obtiveram qualquer grande incentivo ao debate e diálogo sociais, tendo estes ocorrido de forma muito tímida e, basicamente, em processo de reação às medidas que então começaram a se apresentar. Tamanha, assim, a falta de interesse do Governo na participação popular, que as Reformas até o momento aprovadas ocorreram, salvo poucas exceções, nos moldes do desejado pelo e para o Governo, suas políticas e intenções, em um momento em que o contexto mundial já há muito aponta para uma mudança de foco na condução da política, que não mais se sustenta, inclusive em regimes democráticos, na mera e isolada representatividade pós-eleitoral, com outorga quase que irrestrita, absoluta e definitiva de poderes, para o período do mandato, aos políticos eleitos. Por conseguinte e, realmente, se no contexto contemporâneo vem-se consolidando uma ruptura política sem precedentes na história do Brasil democrático, nada, paralelamente, vem impedindo práticas governamentais vetustas e conservadoras para a consolidação de interesses de governo. Uma administração executiva já nascida com a marca da provisoriedade, mas que deixa rompantes e marcos regulatórios de consequências profundas para o Brasil presente e, máxime, futuro. E sem, repita-se, uma legitimidade confirmada e materialmente ratificada pelo povo brasileiro. As Reformas conseguidas e outras que podem ainda ocorrer, em um curto período de tempo, pelo menos até a data presente, mostram-se, repita-se, muito menos para o povo e, significativamente, muito mais, para o Governo, para a Administração Pública amplamente considerada, seus negócios, interesses, trocas e grupos de pressão tradicionais e específicos, classes e camadas detentoras do poder econômico em cenários de restauração de medidas liberais, sob o slogan da redução da inflação, do crescimento econômico e do aumento dos postos de trabalho sob a concomitante suavização do rigor aplicacional de direitos fundamentais constitucionalizados. Aliás, se se falar destes últimos, ou seja, dos direitos fundamentais, normas como a da proibição do retrocesso, do devido processo legal, do direito adquirido, entre tantas outras, encontram-se em patente agonia e desespero, já que, uma coisa é reformar para se manter ou ampliar direitos; outra, bem diferente e juridicamente contrária às teorias sobre os mesmos direitos fundamentais, é reformar para reduzir. Ainda que a redução seja latente e não clara, o que pode, certamente, ser bem pior, bem mais lesivo, enfim, bem mais perverso para os maiores destinatários dessa tão nobre, importante e, pelo ora Autor considerada, imprescindível categoria de direitos. A parca esperança é que o futuro prove um rumo contrário ou diverso. Uma esperança, entretanto, fadada à grande chance de morrer precocemente, contrariando suas mais clássicas tradições. B, L.